18 dezembro 2025 - 09:30
Na entrevista da ABNA com Fátima Atsuko Hoshino
Da Universidade de Tóquio a Qom; o legado de Fátima al-Zahrāʾ (a.s.), um presente do Imam Reza (a.s.)

A mulher japonesa que, há 15 anos, em uma cidade sem mesquita nem husseiniyya, apenas por meio de pesquisas na internet, começou com a simples pergunta “por que gastam tanto contra o Islã?” e chegou, na prática, ao verdadeiro sentido de viver na servidão a Deus, hoje vive em Qom. Recebeu seu chador como presente no santuário do Imam Reza (a.s.), vestiu o legado de Fátima al-Zahrāʾ (a.s.) e encontrou tranquilidade sob a sombra de sua mãe espiritual, Hazrat Masuma (a.s.).

Agência Internacional Ahl al-Bayt (a.s.) – ABNA:
Fátima Atsuko Hoshino, cidadã japonesa residente em Qom, há mais de 15 anos, em completo isolamento e sem qualquer contato direto com muçulmanos, conheceu o Islã exclusivamente pela internet, tornou-se muçulmana e, posteriormente, aderiu ao xiismo.

Nesta conversa sincera com a ABNA, ela apresenta um relato marcante de sua busca pela verdade: dores interiores, descoberta da ʿubūdiyya (servidão a Deus), enfrentamento de dúvidas, aceitação do hijab e do chador e, por fim, a migração para Qom. Uma história que começou com curiosidade diante da propaganda midiática e terminou com serenidade eterna junto a Hazrat Masuma (a.s.).


Não havia muçulmanos ao meu redor

Eu vivia em uma pequena cidade chamada Oujita, na província de Niigata. Era estudante e fui para Tóquio por causa da universidade. Não havia nenhum muçulmano ao meu redor — nem pregador, nem amigo, nem sequer um muçulmano não-missionário. Eu só via muçulmanos de longe e, para ser sincera, naquela época não tinha uma boa impressão deles. Havia muçulmanos cujo comportamento não era adequado, e eu não sentia algo positivo em relação a eles.

No Japão não existe mesquita xiita construída. Há uma husseiniyya dentro da embaixada do Irã, ou então alguém realiza cerimônias em casa e convida algumas famílias. Não temos uma comunidade forte, não há oração de sexta-feira. O ramo da al-Mustafa foi fundado há mais de dez anos; algumas pessoas trabalham ali, mas nossas atividades são limitadas e não alcançam o nível das comunidades sunitas.


Fiquei curiosa, porque gastavam muito dinheiro

Desde a infância eu procurava algo que acalmasse meu coração. Conheci diversas seitas budistas, cristãs e judaicas — cheguei até a experimentar práticas ascéticas e magia, buscando algum poder sobrenatural para me sentir melhor. Mas a dor não passava. Havia um grande vazio dentro de mim, e eu não sabia o que era.

Depois do ano 2000, a televisão dizia: “Muçulmanos são terroristas, matam não-muçulmanos, tornam o mundo inseguro — 11 de Setembro, queimas do Alcorão…”. Pensei: para que tudo isso? Ninguém gasta dinheiro sem motivo. Fiquei curiosa: por que destruir o Islã era tão importante para eles? Foi dessa pergunta que tudo começou.

Estudei e vi que tudo era o oposto — exatamente 180 graus ao contrário. Apresentavam o Islã como “a religião da espada”, mas os muçulmanos, onde quer que vão, começam com “as-salāmu ʿalaykum” — uma saudação bela, que é ao mesmo tempo um desejo de paz, saúde e segurança. Totalmente contrário às imagens da mídia.

Mostravam as mulheres como oprimidas e sem direitos. Diziam que o Islã oprime as mulheres, mas mais de 80% dos recém-convertidos são mulheres. Se o hijab fosse símbolo de opressão, os homens se converteriam mais. A mídia apresenta o hijab como símbolo de submissão, mas a realidade é o contrário. No Islã, as mulheres são muito respeitadas; há muitas figuras femininas sagradas, e sua posição é muito mais elevada do que no budismo ou no cristianismo — com mais direitos.


“ʿUbūdiyya”: o sentido da vida

Minha pergunta era: para que serve a vida? Qual é o objetivo da vida humana? Em lugar nenhum encontrei uma resposta clara e convincente. O Alcorão respondeu:
“E não criei os gênios e os humanos senão para que Me adorem” (51:56).
ʿUbūdiyya. Simples e firme.

Essa resposta esclareceu todas as minhas dúvidas — clara e sólida, ao contrário de outras religiões, cujas respostas eram vagas. Minhas dores interiores foram curadas. Naquela época, às vezes eu até pensava em suicídio, mas esses pensamentos desapareceram. Encontrei o sentido da vida, encontrei meu valor. Minha visão de mundo mudou: este mundo não é a vida principal; é um lugar de prova. A vida verdadeira é a do Além. Quando compreendi e aceitei isso de verdade, minhas dores foram curadas.

Eu não podia deixar de me tornar muçulmana. Pronunciei a shahādatayn. O conhecimento do Islã me fez bem, deu-me autoconfiança e me permitiu enxergar melhor o mundo. Encontrei aquilo que estava perdido dentro de mim.


A súplica de Kumayl abriu meus olhos

Dois ou três meses depois de me tornar muçulmana, minha única fonte de informação era a internet — não havia muçulmanos ao meu redor. Encontrei um site sobre súplicas e visitas devocionais xiitas. Na lista vi “Duʿāʾ Kumayl”. Não sabia o que era, mas abri. Fiquei horas sem me mover. O conteúdo era extraordinário — falava de Deus e da existência. Aquilo não podia ser obra de uma pessoa comum.

Ali dizia que essa súplica foi transmitida por Imam ʿAli (a.s.). Eu só tinha ouvido seu nome — uma figura muito famosa na história islâmica — mas não o conhecia de verdade. A partir daí tudo começou. Li mais súplicas; quanto mais lia, mais compreendia o Alcorão e Deus. Conheci o Hadith al-Thaqalayn: “O Alcorão e a Ahl al-Bayt”. O muçulmano deve ter ambos. O Profeta tinha dito a verdade.

Quando conheci a Ahl al-Bayt (a.s.), tudo ficou mais claro. Antes eu vivia em um mundo em preto e branco; agora meus olhos se abriram para um mundo colorido. Passei a me interessar cada vez mais pelos livros sobre a Ahl al-Bayt (a.s.).


Tornei-me xiita porque buscava a verdade

Dois ou três meses após minha conversão, viajei à Coreia do Sul e conheci uma estudante da Malásia. Quando soube que eu havia aceitado o Islã, disse: “Nem todos os muçulmanos são muçulmanos; alguns são incrédulos e idólatras — no Irã, no Líbano, no Iraque”. Naquele momento não entendi. Ao voltar ao Japão, pesquisei esses países e descobri que ela se referia aos xiitas.

Na internet havia muitas dúvidas e acusações: “Os xiitas adulteraram o Alcorão, só fazem prostração sobre o turbah e são idólatras” (mais tarde entendi que a prostração sobre o turbah não implica divindade).

Depois obtive, em um centro islâmico sunita, uma tradução japonesa do Alcorão e alguns folhetos. Porém, a primeira grande dúvida surgiu em relação ao falecimento do Profeta (s.a.w.). O livro dizia que, entre os quatro califas, três haviam se esforçado muito para preservar o jovem Estado islâmico… isso era enfatizado, mas também se dizia que apenas Imam ʿAli (a.s.) permaneceu ao lado do Profeta (s.a.w.).

Na cultura tradicional japonesa, o funeral é extremamente importante — mesmo para estranhos fazemos questão de participar. Pensei: todos estavam em Medina; era tão difícil dedicar 10 ou 15 minutos para o funeral?

Aprendi árabe desde o alfabeto. Lia o Alcorão de forma simples e verificava o significado das palavras. Percebi que algumas traduções estavam erradas — meu árabe era básico, mas suficiente para notar os erros. Perguntei por que não corrigiam. Responderam: “É a opinião de nossos sábios; não temos o direito de opinar”.

O exemplo mais claro era o erro na tradução do verso da Wilāya: quando Imam ʿAli (a.s.) deu seu anel em caridade durante o rukūʿ, o versículo define quem deve ser obedecido. Ali aparece a palavra rākiʿīn (os que estão em inclinação), mas na tradução japonesa aparecia “os que se prostram”. Descobri depois que o mesmo erro existe em outras línguas. Com essa falha, o sentido verdadeiro não é transmitido. Encontrei vários versículos semelhantes e percebi que todos os que apresentavam problemas estavam relacionados à Ahl al-Bayt (a.s.). Parecia que alguns não queriam que as pessoas compreendessem sua posição.

Tudo isso foi muito difícil para mim: enfrentar a família, a sociedade, a questão do alimento halal (por 5 ou 6 anos comi carne apenas duas vezes, pois não era fácil encontrar), o hijab foi um grande desafio — chegaram a tentar me expulsar de casa por causa das minhas crenças. E, apesar de toda essa luta, eu sentia que ainda faltava algo. Ouvi um hadith: “Quem morre sem conhecer o Imam de seu tempo morre em ignorância.” Com toda aquela luta, sentir que ainda não bastava foi muito doloroso.

Saber que uma injustiça ocorreu há 1.400 anos e continua até hoje — todos os dias essa injustiça se repete — era algo pesado. Mas, graças a Deus, com o conhecimento da Ahl al-Bayt (a.s.) minha condição melhorou muito, e encontrei tranquilidade.


O hijab foi uma prescrição médica

O Islã me fez bem — como um médico especialista que trata minhas dores interiores, e eu passei a confiar nesse médico. Eu não sou especialista em tudo, mas vi que a orientação desse especialista era correta. Esse médico, porém, me prescreveu uma receita que incluía o hijab. Eu disse: “Está bem”. Se um médico prescreve cinco comprimidos e eu tomo apenas dois, nunca ficarei curada. Segui tudo para alcançar a cura completa — e desde o início não havia ninguém para me orientar; eu vivenciei tudo sozinha.

Meus pais eram totalmente contra o hijab. Dentro da cidade eu era obrigada a não usar lenço. Usava roupas longas e largas — curiosamente, esse tipo de vestimenta agrada aos japoneses. O problema era o lenço. Para não chamar atenção, eu usava um chapéu grande e um cachecol para cobrir de forma adequada. Em Tóquio, porém, eu usava lenço — e às vezes até a polícia de inteligência me seguia (isso soube depois por amigos).

Naquela época, as pessoas conheciam menos o Islã e, por preconceito, se comportavam mal. Foi um desafio total — a ponto de eu decidir migrar para um país islâmico.

Antes, em nome da liberdade, eu fazia coisas que não me tornavam mais livre; pelo contrário, a cada dia eu me sentia mais aprisionada. Na cultura japonesa, a aparência (pele, carne e ossos) define o valor de uma pessoa. Eu tentava basear meu valor na aparência, mas por dentro ouvia o grito da minha própria essência: o valor de uma pessoa não pode se resumir à aparência física; o valor humano deve ser algo além disso. Essa contradição era dolorosa. Quanto mais avançava nessa cultura, mais sentia que estava sendo “consumida”.

Quando me tornei muçulmana praticante e observei o hijab (naquela época ainda sem chador), li um versículo que dizia: “Ordena às mulheres que se cubram para que sejam reconhecidas.” Esse “ser reconhecida” me chamou muita atenção. Antes eu tentava ser reconhecida pela aparência física; depois do Islã, compreendi que esse reconhecimento significa ser reconhecida pela personalidade, pela humanidade e pela fé.

Há uma grande diferença entre essas duas visões: quem busca valores puramente físicos e sexuais vê esses atributos diminuírem com o tempo; por mais que se esforce, a beleza física decai, e isso gera desespero. É uma das razões pelas quais, em culturas materialistas, as pessoas adoecem interiormente e chegam à beira do suicídio. Já o segundo grupo torna-se cada vez mais esperançoso, e a vida se torna mais bela.

Na Surata al-ʿAsr, Deus diz que todos estão em perdição, exceto os que creem e praticam o bem — e eu vi que estava em perdição, e isso foi curado em mim.

Hoje sinto que o hijab, para mim, é uma questão existencial. Assim como no relato de Hazrat Ruqayya (a.s.), que primeiro disse: “Arrancaram meu chador”, e só depois: “Mataram meu pai”. Entendo daí que, sem hijab, eu não posso existir. Sem hijab, não posso ser uma mulher muçulmana com dignidade — a dignidade que Deus destinou à mulher. Para que a fé, o monoteísmo e as ações tenham valor, primeiro é preciso existir de forma íntegra. Além disso, o hijab não limita a mulher; pelo contrário, liberta-a de coisas indignas de sua posição.

A liberdade não pode ser um fim em si mesma; é um estado. Não existe liberdade absoluta — é preciso ver qual tipo de liberdade é digno e benéfico. Com o hijab, tenho a escolha de quem pode me ver; a mulher sem hijab não possui essa escolha.


Recebi o chador como presente no santuário do Imam Reza (a.s.)

Eu só tinha visto o chador em fotos, nunca de perto. Antes de migrar, em minha primeira viagem ao Irã, fui primeiro a Mashhad para a peregrinação. No hotel eu estava extremamente emocionada: Japão de um lado, Mashhad do outro. Eu estava tão perto de um Imam infalível (a.s.) que parecia um sonho. Queria oferecer um agradecimento concreto, um presente ao Imam Reza (a.s.). Pensei: o que poderia deixá-lo feliz? Pela janela do hotel vi mulheres usando chador preto — havia uma beleza espiritual muito forte. Pensei: vou comprar um chador, vesti-lo e oferecê-lo como presente ao Imam Reza (a.s.).

Comprei, vesti e caminhei em direção ao santuário. Enquanto via a cúpula dourada, a cada passo que dava sentia no coração a voz do Imam (a.s.): “Muito bem, minha filha; obrigado.” Fiquei tão encorajada que nunca mais consegui deixar esse presente de lado. Eu pensava que tinha oferecido algo ao Imam Reza (a.s.), mas, na verdade, foi ele quem me presenteou — com o legado de sua mãe, Fátima al-Zahrāʾ (a.s.).


Qom era um sonho

Para alguém que nasceu e cresceu no Japão, onde encontrar comida halal é difícil e cujo maior sonho era ouvir o chamado à oração vindo de uma mesquita, o ambiente de Qom é completamente onírico. Tudo o que muçulmanos de outros países sonham, em Qom está reunido. Agradeço a Deus e me lembro sempre: onde eu estava e onde estou agora — que o hábito não se torne um véu entre o coração e as graças divinas.

Tenho muitos amigos que, como eu, não veem suas famílias há mais de dez anos, mas em Qom não somos estrangeiros. Hazrat Masuma (a.s.) é a mãe de todos nós — em Qom, nós temos mãe. Isso tem um significado profundo. Aqui, pessoas de todo o Irã e do mundo se reúnem em torno da mãe espiritual, vivem juntas como irmãos e irmãs. É algo muito belo.


O Japão despertou — e isso é apenas o começo

Há 10 ou 15 anos era impensável que as pessoas participassem de manifestações por questões geograficamente distantes, mas hoje a consciência aumentou e o olhar mudou positivamente. O eixo da resistência (Palestina, Líbano) despertou as pessoas para a verdade. Eventos como o 11 de Setembro aumentaram muito o número de novos muçulmanos.

Deus diz no Alcorão: “Eles planejaram, e Deus planejou; e Deus é o melhor dos que planejam.” Quanto mais o inimigo tenta ocultar, mais Deus revela a verdade — e isso é algo muito belo.

Minha família, no início, tinha uma visão extremamente negativa. A desinformação sobre o Islã no Japão é enorme. Meus pais não permitiam que eu falasse diretamente sobre o Islã; diziam que não queriam ouvir. Mas expliquei indiretamente. Conversava com meus irmãos mais novos, mostrava as mentiras da mídia, falava da posição da mulher no Islã e esclarecia temas como a lapidação. Lá se apresenta isso como algo fácil e frequente, mas a realidade é totalmente diferente: as condições são extremamente rigorosas e raramente se concretizam. Depois, eles mesmos diziam: “É muito difícil comprovar isso.” Assim percebiam quantas mentiras haviam sido contadas sobre o Islã.

Até mesmo a saudação muçulmana — “as-salāmu ʿalaykum” — tão bela, mudou muito a visão dos meus irmãos mais novos.

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